O EGITO ROMANO

Viviane Roza de Lima – monitora do Museu Egípcio e Rosacruz Tutankhamon Os antigos egípcios dividiam o seu país em regiões distintas (o Delta e Vale do Nilo, separado entre o Alto e Baixo Egito) subdivididas em províncias, sepawat (em grego, nomos: vinte e duas no Alto Egito e vinte no Baixo Egito). O período de 30 a.C-395 d.C é aquele que o Egito passa a ser dominado pelos romanos, um de tantos outros que conquistaram o país ao final do Reino Novo (1580-715 a.C) tal como os assírios (670 a.C), os persas (525 a.C) e os gregos (332 a.C). O país passou a ser dividido em três partes, a Tebaiada (Alto Egito), a Heptanômia (Médio Egito) e o Delta (Baixo Egito), regiões controladas por civis seniores romanos, epistrategos, com exceção da cidade Alexandria que era administrada por um corpo especial de magistrados. As “cidades” egípcias eram hierarquicamente divididas em póleis (modelo de cidade grega), em metrópoles (antigas capitais dos nomos) e em aldeias. Ocorreram importantes transformações sociais graças a infusão de novas ideias que adaptaram a prática popular religiosa egípcia, não como uma “sobrevivência pagã”, mas como uma forma de reorganização desta cultura religiosa. Desde os primórdios, as divindades egípcias se associavam com outras, nacionais ou estrangeiras, a fim de demonstrar seu poder mediante suas múltiplas identidades, e suas formas físicas diferenciadas eram meras formalidades que auxiliavam o culto pessoal do indivíduo. O culto a deusa Ísis, por exemplo, amplamente difundido em todas as épocas egípcias, tornou-se mais popular com santuários cada vez mais numerosos demonstrando assim uma profunda paixão romana pelo que estes entendiam ser a cultura egípcia. Para os egípcios, a deusa era grande maga e curandeira, protetora dos mortos e vivos, senhora do céu, deusa da vida, do renascimento e responsável pela inundação do Nilo. Sendo assim, a estrela canina (em egípcio,  Sopdet; em grego, Sothis) marcava o início da inundação do Nilo sendo a deusa associada ou assimilada a Sirius, embora no Egito tais representações eram raras, se não inexistentes. Gregos e romanos encaravam a aparição de Sirius como indicativo da aproximação dos dias de calor sufocante do final do verão, daí a expressão “dias de cão”. Para os gregos, a estrela era associada ao calor, fogo e febres, que acreditavam ocasionar queimaduras em pessoas e plantações, e afetar o comportamento dos animais, em especial dos cães. Para os romanos, os dias caniculares (Canicula, o nome latino de Sirius) também eram associados a lobos vorazes, e graças ao seu aspecto sinistro sacrificavam cães a fim de salvarem as suas plantações. Embora os egípcios não tivessem uma tradição original de associar a deidade estelar a cães, certamente as crenças gregas e romanas posteriores causaram um impacto de forma que se desenvolveu um sistema intercultural de crenças associadas tanto a Sirius quanto a Ísis. Uma inovação iconográfica passou a se expandir com os elementos egípcios associados a versões romanas dos cultos a deusa e, como consequência, passaram a ser vistas cada vez mais estátuas de Ísis-Sothis: a divindade montada em um cão que carregava uma estrela no alto de sua cabeça. Cão Sothíaco https://www.britishmuseum.org/collection/object/Y_EA57356 Figura de terracota típica dos séculos I a III d.C, apresentando um cão de caça da raça Spitz associado à deusa Ísis. Ísis-Sothis em um cão https://collections.smvk.se/carlotta-mhm/web/object/3009933 A deusa montada em um cão usando vestido longo, um nó de Ísis em seu peito e uma coroa com chifres e disco solar. Relevo do templo de Ísis na Hungria http://lupa.at/8007/photos/7 Na antiga colônia Claudia Savaria fundada como assentamento de veteranos pelo imperador Claudio em 41 d.C, foram achados os restos de um santuário da deusa Ísis. Restos do templo de Ísis na Hungria http://lupa.at/regional_infos/44?page=3 Referências Bibliográficas ‌BØGH, Birgitte. The Graeco-roman cult of Isis. In: The Handbook of Religions in Ancient Europe. Routledge, 2014. p. 228-241. HOLBERG, Jay B. The Dog Star. In: Sirius Brightest Diamond in the Night Sky. New York, Springer Praxis Books, 2007.pp. 15-21 VASQUES, Marcia S. A chora egípcia e as identidades culturais no Egito Romano: uma abordagem arqueológica. Disponível em: https://anpuh.org.br/uploads/anais-simposios/pdf/2019-01/1548210412_61aae68605e9992ea905f2e3ce4362f8.pdff> WILKINSON, Richard H. The complete gods and goddesses of ancient Egypt. Thames & Hudson, 2003.

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A Grande Esfinge de Gizé

            Por: Vinicius Dzala Lara Wassem – Monitor do Museu Egípcio e Rosacruz Quando se pensa sobre o Egito Antigo, uma imagem que geralmente vem à mente é a da grande Esfinge de Gizé, que dizem ser coberta de mistérios, charadas e maldições. Mas será que ela realmente representa isso tudo ou haviam outros significados sobre ela? O grego Heródoto foi um dos primeiros a escrever sobre os egípcios, porém ao chegar na terra das pirâmides, os sacerdotes se recusaram a compartilhar seus conhecimentos com ele, o que levou Heródoto a tomar as próprias conclusões sobre a cultura egípcia antiga. Uma das observações de Heródoto foi sobre a Esfinge de Gizé, localizada a leste da pirâmide do faraó Kafra (Quéfren) e ligada a ela pelo acesso da rampa entre o templo do vale e o templo da pirâmide. Heródoto acabou por chamar o monumento como “Esfinge” que na realidade é o nome dado a uma criatura da mitologia grega, caracterizada por ter o rosto humano, corpo de leão e asas em suas costas, se dizia que era comum que as esfinges fizessem charadas a humanos, que quando não sabiam responder, acabavam devorados. Assim, Heródoto associou as criaturas mitológicas às estatuas egípcias, criando-se a ideia de que o real significado das esfinges seria esse. Entretanto, as estatuas representavam o poder e a divindade do próprio faraó, dando a ideia de que o Rei era sagrado e poderoso, e possuía a força e vigor de um leão. A Esfinge de Gizé tem nela representada o rosto do faraó Quéfren, mostrando ser datada da IV Dinastia (2575-2465 a.C.). Um outro fato curioso sobre esta Esfinge, é a Estela dos Sonhos, uma placa de granito posta entre as patas dianteiras da estátua, que fala sobre a primeira tentativa de “desenterrá-la” da areia, já que teria sido soterrada até os ombros após o abandono da necrópole de Gizé. A Estela tem a seguinte inscrição: “… o filho real, Tothmés, chegou, enquanto caminhava ao meio-dia e sentando-se à sombra deste poderoso deus, foi superado pelo sono e dormiu no exato momento em que Rá estava na cúpula [do céu]. Ele descobriu que a majestade deste deus falou-lhe com sua própria boca, como um pai fala para o filho, dizendo: Olhe para mim, contemple-me, ó Tothmés meu filho, eu sou o teu pai, Harmakhis-Khepri – Ra – Atum, eu conceder-te-ei a soberania sobre o meu domínio, a supremacia sobre a vida… Eis a minha condição real para que tu proteja todos os meus membros perfeitos. A areia do deserto que estou colocado cobriu-me. Salve-me, fazendo com que tudo o que está no meu coração seja executado.” A Estela fala que o responsável pela primeira escavação, da qual se tem notícia, teria sido o faraó Tothtmés IV (1401-1391 a.C.), que recebeu a mensagem da própria Esfinge através de um sonho, enquanto tirava um cochilo próximo a escultura, no qual ela pedia que lhe fosse removida a areia, e em troca, o deus Sol faria dele rei. No decorrer do século XIX, em 1817, houve uma nova restauração supervisionada pelo italiano Giovanni Caviglia, descobrindo todo o peito da estátua, e apenas em 1925 foi completamente desenterrada. Em 1926 parte de seu turbante teria caído, por conta da erosão fazendo com que em 1931 engenheiros trabalhassem na região de sua cabeça para uma restauração total, mostrando a Esfinge como temos até os dias atuais. BAINES, John; MALIK, Jaromir. Cultural Atlas of Ancient Egypt. London: Andromeda Oxford Limited, 2008. HART, George. The British Museum Pocket Dictionary of Ancient Egyptian Gods and Goddesses. British Museum Press, 2001.

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Tutankhamon – O faraó menino

Por Arthur Fanini Carneiro Tutankhamon foi faraó durante a XVIII Dinastia (c. 1550-1307 a.C.), sucedendo seu pai Akhenaton, governante responsável pela reforma amarniana. Nesta passou-se a cultuar um único deus, Aton – representação do disco solar. Quando Akhenaton morreu o culto a Aton foi abandonado e após uma conturbada sucessão ao trono, o jovem príncipe Tutankhamon, filho de uma segunda esposa do faraó, ascendeu ao governo com a idade entre nove e dez anos. Durante seu governo Tutankhamon reabriu os templos e retomou os cultos abolidos por seu pai, em especial ao deus Amon. Seu nome enquanto vivia na corte de Akhenaton era Tutankhaton que fazia alusão ao nome do deus Aton. Com o retorno às antigas crenças o jovem faraó alterou seu nome para a forma mais conhecida: Tutankhamon que significa “ imagem viva de Amon”. Tutankhamon casou-se com sua meia-irmã, Ankhesenamon, que era filha de Akhenaton e Nefertiti. Devido à idade do jovem soberano, a administração política e econômica ficou sob controle do vizir conhecido como Ay, o qual teve o apoio militar do principal comandante do Egito na época, o general Horemheb. Durante o reinado de Tutankhamon, a política externa foi restaurada e as relações com os vizinhos do Egito melhoradas. Mesmo assim, tendo sido um governo diplomático e tendo relações exteriores bem-sucedidas, batalhas ocorreram entre egípcios, núbios e asiáticos sobre o território que controlava as rotas de comercio. Tutankhamon ordenou reparações de templos sagrados como a continuação da construção do templo de Karnak, em Luxor, a antiga Tebas.  Uma rara imagem do faraó Tutankhamon em seu papel oficial como governante se localiza na tumba de seu vice-rei, Amenhotep Huy, na Nubia. Nela podemos ver o jovem rei realizando seus deveres oficiais sozinho. O papel do vice-rei era manter o ouro fluindo da Nubia para o Egito, ouro que seria utilizado tanto no ataúde quanto na máscara mortuária do faraó. Entre dezenove e vinte anos de idade Tutankhamon faleceu. Seu corpo levou setenta dias para ser mumificado por completo, e esse foi o tempo que os trabalhadores tiveram para os preparativos de sua tumba. Seu corpo foi transportado de balsa pelo Nilo até o local de seu sepultamento no Vale dos Reis. Tutankhamon não deixou herdeiros. Ankhesenamon era a única herdeira real viva, e após a morte de seu marido casou-se com o vizir Ay, tornando-o o novo faraó. Ay teve grande influência no reinado de Tutankhamon. Aconselhava o rei, ministrava a justiça e controlava a entrada ao palácio. Apesar de seu curto governo, Tutankhamon é um dos faraós mais famosos da história egípcia, não tanto por seus atos políticos, mas por sua tumba descoberta em 1922, por Howard Carter, que revelou uma grande riqueza em termos de objetos funerários e cotidianos a qual nenhuma outra tumba real possui.         Detalhe do trono de Tutankhamon. Original: Museu Egípcio – Cairo   Máscara do Tutankhamon. Original: Museu Egípcio – Cairo.   Tumba de Amenhotep-Huy – Amenhotep-Huy com o rei Tutankhamon   Referências Bibliográficas BRIER, Bob. O Assassinato de Tutancâmon. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2001. CARDOSO, Ciro Flamarion. O Egito Antigo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 2004. CARTER, Howard. The Tomb of Tutankhamun. London: Ed. Bloomsbury, 2014. CARTER, Howard e MACE, A.C. A Descoberta da Tumba de Tutankhamon. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2004. COELHO, Liliane Cristina. Mudanças e Permanências no Uso do Espaço: A cidade de Tell El-Amarna e a questão do urbanismo no Egito Antigo. Tese de Doutorado. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2015. 308f. DODSON, Aidan. Amarna Sunset: Nefertiti, Tutankhamun, Ay, Heremheb, and the Egyptian Counter-Reformation. Cairo: AUC Press. 2009. FRONZA, Vanessa. Ações restauradoras de Tutankhamon: a retomada de Tebas como principal centro religioso do Egito após a reforma amarniana. Revista Plethos, Niterói, 3, 2, 2013. p.105-118. HANKEY, Julie. A Passion for Egypt. London: Ed. Publishers, 2001. JOHNSON, Paul. Egito Antigo. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. MELLA, Federico A. Arborio. O Egito dos Faraós. São Paulo: Editora Hermus, 1998. PRICE, Bill. Tutankhamun: Egypt’s most famous Pharaoh. Herts: Ed. Pocket Essenials, 2007.    

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Maat: princípios regentes do Egito faraônico

  Por: Shara Lorena Gritten Mello A deusa Maat era representada pelos egípcios com a aparência de uma jovem mulher com uma pena de avestruz em sua cabeça. A origem da deusa é incerta, provavelmente tenha surgido nos períodos mais remotos da história egípcia, durante o Pré-Dinástico (c. 5000 – 3000 a.C.). Segundo a mitologia egípcia, Maat era filha de Rá (o deus do sol) e esposa do deus Thot (deus da escrita e sabedoria). Para os antigos egípcios, essa divindade simbolizava a justiça e a verdade. Em sua balança, o coração do morto era pesado perante o tribunal do deus Osíris, revelando assim as infrações do morto a uma de suas 42 regras. Se o coração, que representava a consciência – ou era onde ela estava guardada – fosse mais leve que a pena da deusa, o morto passaria ao paraíso de Osíris. Porém, se o coração fosse mais pesado que a pena, Ammit, que era uma deusa representada por animais perigosos da África como o crocodilo, o leão e o hipopótamo, devoraria o coração e o morto desapareceria para sempre. O simbolismo da deusa também estava associado a realeza egípcia e seus princípios deveriam ser “respeitados” pelos faraós. Cultos diários deveriam ser realizados para Maat. Neste caso, ela também era considerada a regente do cosmos e, novamente, vista pelos egípcios como a deusa do equilíbrio e da ordem. Os egípcios acreditavam que se Maat não estivesse satisfeita com os cultos realizados pelos faraós e sacerdotes, um desiquilíbrio poderia ocorrer. Por exemplo, a cheia do rio Nilo não aconteceria e a população passaria fome. Seus centros de culto, normalmente, eram dentro de outros templos maiores como, por exemplo, os dedicados as deusas Háthor e Isis. O faraó Amenhotep III (1391-1353 a.C.) mandou construir um templo para a deusa em Karnak e há outros também que estão localizados em Mênfis e Deir el-Medina. Podemos perceber que a deusa era muito importante para os egípcios, cultuada tanto na vida quanto na morte. Sem a ordem, sobraria para os egípcios apenas o caos. A sociedade egípcia antiga baseou suas leis e muitos costumes na crença a esta deusa e seus princípios que chamavam de Maat. Deusa Maat representada alada – Cena presente na tumba da rainha Nefertari Faraó Seti I oferecendo Maat a Amon-Rá – Templo de Seti I em Abydos Julgamento do morto na balança de Maat – Papiro de Ani – Museu Britânico

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A Deusa Néftis: aspectos e definições

  Shara Lorena Gritten Mello – Monitora do Museu Egípcio Embora pouco lembrada, Néftis é uma deusa da enéade da cidade de Heliópolis, e uma das principais divindades presentes no panteão dos egípcios antigos, tendo sua aparência idêntica à de sua irmã Isis. Porém, muitos de seus aspectos são misteriosos até os dias de hoje. Na mitologia desenvolvida na cidade de Heliópolis, Néftis era esposa do deus Seth, que era estéril, e para poder conceber um filho se disfarçou de Isis, que era casada com Osíris, e passou uma noite com o marido de sua irmã. Desse ato nasceu Anúbis, deus da mumificação. As principais representações iconográficas da deusa aparecem em tumbas ou sarcófagos. Podemos usar para melhor entende-la os “Textos das Pirâmides” e os “Textos dos Sarcófagos”, que são um conjunto de fórmulas mágicas, encontrados nos caixões e paredes das tumbas. Seu nome significa “Senhora da Casa” ou “Senhora do Templo”, embora ainda não se tenha encontrado nenhum centro de culto dedicado a deusa. A literatura egípcia esclarece pouco sobre o papel de Néftis, pois antes da mitologia da cidade de Heliópolis, não se conhece outro texto com citação sobre a deusa. O que sabemos é que ela está ligada com a mitologia Osiriana. Muitas vezes, Néftis aparece associada com Isis e no contexto funerário elas protegem o morto. Isis vai a frente do morto protegendo seus pés, Néftis vai atrás protegendo a cabeça. Segunda a mitologia, Néftis chorou com sua irmã pelo falecimento do deus Osíris. Dentro das tumbas a deusa aparece como protetora dos mortos e dos vasos canópicos. Muitos amuletos foram produzidos para a deusa principalmente durante as 22° e 26° dinastias egípcias, onde a produção desses objetos é muito comum. Infelizmente podemos saber apenas alguns aspectos e definições de Néfits, porém, ela foi largamente representada no Egito, desde o Reino Antigo chegando até a Baixa Época. Por mais que o papel da deusa não fique completamente definido, podemos concluir que ela foi muito importante para os egípcios, pois ela é a mãe do deus da mumificação, Anúbis, além de estar relacionada à crença da vida além-túmulo, pois auxiliava o morto em sua travessia para os campos de Osíris. Estátua néftis-Periodo Tardio-encontra-se no museu do Brooklyn(Brooklyn Museum) Néftis e Isis – Tumba nefertari Isis and Nephtys- Tumba Sennedjam

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