A sucessão de Akhenaton

A sucessão de Akhenaton Por: Gabrielle Lenartevitz – monitora do Museu Egípcio e Rosacruz Tutankhamon. Às margens do rio Nilo, há milhares de anos, floresceu uma das civilizações mais fascinantes da história: o Egito Antigo. Com suas paisagens naturais, logo se fortaleceu pela agricultura e claro, por sua cultura. A população egípcia era politeísta e adorava uma grande variedade de deuses ligados as cidades, funções humanas e natureza – como Anúbis, representado com a cabeça de um chacal[1] , se vinculando a mumificação. Cada cidade adorava sua divindade padroeira, ou principal, e o faraó atuava como intermediário entre os deuses e os humanos, garantindo uma harmonia coletiva do cosmos e a continuidade da vida, interpretados como a manutenção de Maat[2] (Figura1), ou seja, o equilíbrio entre a ordem cósmica dos deuses, a natureza e a própria civilização egípcia. Grandes templos do Egito, como Karnak e Luxor, serviam como um palco para rituais dessa cultura diversa e complexa, reafirmando o poder divino do faraó e consolidando a relação entre religião e política. A XVIII Dinastia (1550-1307 a.C.), parte do Reino Novo, destacou-se pela expansão territorial, riqueza e estabilidade. Akhenaton, conhecido originalmente como Amenhotep IV (figura 2), nasceu nessa dinastia e herdou o Egito próspero de seu pai, Amenhotep III. Akhenaton cresceu em um ambiente de prestígio e influência, moldando sua visão de autoridade e abrindo caminhos para seus futuros pensamentos enquanto Rei. Sua esposa, Nefertiti, desempenhou papel importante no reinado e esteve presente em diversas obras do período amarniano, acompanhando as mudanças religiosas e culturais.    Ao assumir o trono, Akhenaton promoveu mudanças consideradas radicais, concentrando o culto ao disco solar Aton (Figura 3), divindade associada à vida, fertilidade e energias divinas. Essa mudança religiosa representava uma enorme ruptura com o politeísmo tradicional e foi considerada uma forma de monolatria, onde apenas uma única tríade era adorada, sendo Aton, Nefertiti e o próprio Akhenaton, além de ser uma forma de Henoteísmo na qual Aton possuía as funções de todos os demais, como destaca Elvis Rodrigues (2008, p. 10). A própria arte no Egito antigo refletia essas transformações e retratava o faraó e sua família de forma mais realista e humanizada, como em cenas da sua vida cotidiana, rompendo com o estilo rígido e idealizado dos períodos anteriores. Dessa forma, Akhenaton incentivou um novo estilo artístico e um novo padrão de beleza. Anthony Janson (1996, p. 24) compara obras-primas do faraó com a sua esposa, Nefertiti, em que os contornos do rosto de Akhenaton deixam claro um abandono de técnicas mais ideais em prol de uma forma de realismo (Figura 4). Essa reforma impactou a vida dos egípcios, alterando diretamente seus cultos religiosos, porém a administração do Egito também sofreu. O clero de Amon [3]  (Figura 5) que anteriormente concentrava grande poder político e econômico, teve seus privilégios reduzidos. A centralização em torno de Aton gerou diversas tensões internas, problemas econômicos e militares surgiram devido à mudança da capital e as novas prerrogativas religiosas dificultaram a adaptação da população aos cultos recém-implementados.    A consolidação do projeto de Akhenaton aconteceu após a criação de uma nova capital, Akhetaton, a atual Tell el-Amarna, totalmente dedicada a Aton. Esta capital, demonstrando a nova era do Egito e uma nova ordem religiosa e administrativa, simbolizava o isolamento em relação as tradições que haviam governado o Egito por milênios. Após a morte de Akhenaton, Tutankhamon (Figura 6), seu filho, assumiu o governo com apenas nove anos de idade, com auxílio de conselheiros e sacerdotes sendo responsável por restaurar o culto tradicional a Amon, abandonando Amarna e retornando à antiga capital, Tebas. Com isso, todos os deuses antigos retornaram para os templos que agora reabriam. Assim, a restauração consolidou a autoridade do clero e iniciou o movimento para a estabilidade política e social. Apesar da restauração, Akhenaton e seus pensamentos não foram completamente esquecidos. Mesmo com boa parte de seu nome e imagens apagadas de monumentos (Figura 7), em um processo conhecido como damnatio memoriae[4], ele mudou para sempre a concepção de religião no Antigo Egito, impactando toda a classe de sacerdotes. A arqueologia moderna recuperou, em parte, sua história através das obras artísticas, arquitetônicas e literárias do período Amarna e da cidade de Akhetaton. Seu legado é amplamente estudado e reconhecido por suas características culturais e religiosas, inovação artística e capacidade de modificar tradições milenares. Seu sucessor, Tutankhamon, teve um curto reinado, retornando às antigas práticas e cultos religiosos e devolvendo a influência do clero de Amon após as reformas de Akhenaton. Embora breve, o governo de Tutankhamon se tornou um dos períodos mais conhecidos e debatidos da história egípcia. Referenciado como Rei menino de ouro, teve sua tumba descoberta durante uma expedição arqueológica no início do século XX. Entre os mais de cinco mil objetos encontrados em sua tumba, por Howard Carter, em 1922, boa parte em impressionante estado de conservação, estavam tesouros que revelam aspectos da vida, da religião e do cotidiano do Rei egípcio antigo, reavivando a memória do governante. [1] Chacal: animal da natureza egípcia, se localizava próximo a carcaças, vestígios de animais mortos, onde guardava aquela carne, se conectando com a morte e a mumificação egípcia. [2] Maat: deusa egípcia, representada com asas e uma pena na cabeça. Responsável pela justiça e equilíbrio de vida. [3] Amon: deus do Egito antigo, protetor dos faraós e rei dos deuses. [4] DEMNATIO MEMORIAE: “condenação da memória” na língua latina. No direito romano, indicava o apagamento de qualquer traço de lembrança de uma pessoa, com se jamais tivesse existido. Glossário Chacal: animal da natureza egípcia, se localizava próximo a carcaças, vestígios de animais mortos, onde guardava aquela carne, se conectando com a morte e a mumificação egípcia. Maat: deusa egípcia, representada com asas e uma pena na cabeça. Responsável pela justiça e equilíbrio de vida. Amon: deus do Egito antigo, protetor dos faraós e rei dos deuses. Demnatio Memoriae: “condenação da memória” na língua latina. No direito romano, indicava o apagamento de qualquer traço de lembrança de uma pessoa, como se jamais tivesse existido.

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