Hatshepsut – A Rainha-Faraó

Por: Camila Dayane Olexciw do Rosário – Estudante de história e monitora do Museu Egípcio e Rosacruz No Egito Antigo as funções desempenhadas socialmente eram estabelecidas de acordo com as construções sociais, existindo tarefas atribuídas para ambos os sexos. Essas funções poderiam ser alteradas, embora não fosse comum a posição de faraó a uma mulher. Em meados da XVIII Dinastia (1550-1307 a.C.), mediante um momento onde as rainhas haviam conquistado grande espaço dentro do cenário templário e governamental, surgiu Hatshepsut, uma personagem que, durante muito tempo, foi relegada a um posto de usurpadora dentro da Egiptologia. Filha do faraó Tothmés I e da Rainha Ahmés, Hatshepsut perdeu em sua juventude os dois irmãos e uma irmã, tornando-se herdeira legítima do rei. Embora a linhagem real se reservasse a princesa, o faraó possuía um filho com uma esposa secundária, e para que este pudesse ascender ao trono, Hatshepsut o desposou. Ele ficou conhecido como Tothmés II. Com essa união, Tothmés II consagrou-se rei e ambos receberam prerrogativas. Para Hatshepsut foram atribuídas titulações, como por exemplo o de Grande Esposa Real e as honras devidas à “Primeira Dama das Duas Terras”, reconhecido o estado de “Aquela que vê Hórus e Seth”. O casamento rendeu apenas uma filha, a princesa Neferura, também herdeira legítima do trono. Sem mais herdeiros e devido a morte precoce do rei, o trono do Egito ficou à cargo de um filho secundário concebido por uma concubina, a Esposa Real Aset, igualmente chamado Tothmés. Após o falecimento do faraó e pouca idade de Tothmés III, Hatshepsut tornou-se a regente do reino, a fim de administrá-lo até que seu enteado pudesse assumi-lo. O cargo de Regente não existia no Egito, por isso ela manteve-se no poder devido ao título de Grande Esposa Real. A presença da Rainha como regente do Egito é encontrada desde o ano 2 do reinado de Tothmés III e em grande parte das representações, possui ao seu lado a presença do enteado. A partir do quinto ano de Tothmés III as representações da rainha começaram a ser alteradas e no sétimo ano de administração, revelou-se como Rei do Alto e do Baixo Egito. Embora assumiu a representação de Faraó, Tothmés III não deixou de aparecer ao lado de Hatshepsut, eliminando as hipóteses levantadas a respeito da usurpação do trono ao longo dos anos por pesquisadores. As mudanças na maneira como a Rainha-Faraó passou a ser representada se alteraram com o tempo. Essa transformação está relacionada a uma masculinidade que passou a ser assumida por Hatshepsut, utilizada para legitimar seu poder como Faraó, considerando que a mesma possuía o espírito de Hórus, o Deus vivo, em seu corpo e assim poderia governar. Além da representação masculinizada assumida por Hatshepsut, a mesma também utilizou uma mitologia referente ao seu nascimento relacionada ao Deus Amon, a favor de sua aceitação como Faraó. A mitologia está representada no templo de Deir El-Bahari e consagrou Hatshepsut como a filha do Deus Amon, que disfarçado de Tothmés I, relacionou-se com a Rainha Ahmés, que engravidou de Hatshepsut. Como Faraó, manteve um governo próspero e realizou a construção de diversos monumentos. Os primeiros feitos de seu reinado foram os obeliscos no extremo leste do templo de Karnak, que trazem seus títulos como Rei. Apesar da multiplicidade de seus feitos, sua maior construção é o templo de Deir El-Bahari, dedicado a Rainha-Faraó e de beleza arquitetônica imensurável. Seu nome egípcio era Djeser Djeseru que quer dizer, Sublime dos sublimes. Quando suas construções foram descobertas por egiptólogos no século XIX, muitos não consideravam de que aqueles elementos diziam respeito a uma governante mulher, inclusive Champollion, que após a tradução dos hieróglifos visitou o Egito, negou a possibilidade do templo de Deir El-Bahari pertencer a uma Rainha-Faraó. A confirmação veio alguns anos mais tarde, devido a diversos fatores, como, por exemplo, o conhecimento da escrita hieroglífica, onde a letra “t” do nome da rainha é oriundo do símbolo de um pão egípcio, que pode ser interpretado como um determinativo feminino. Hatshepsut governou o Egito por cerca de 20 anos. Não há nenhum registro que indique um mal-estar entre a Rainha e o enteado, possibilidade considerada e já descartada pelos egiptólogos. Deixou inúmeros monumentos e foi muito importante para história egípcia antiga e para a história das mulheres.   Referências: NOBLECOURT, Christiane D. A mulher no tempo dos faraós. Paris: Éditions Stock,1986. SOUSA, Aline F. A mulher-faraó: representações da rainha Hatshepsut como instrumento de legitimação (Egito Antigo – Século XV A.C). Niterói, 2010 LAZZAROTTO, Gabriela – “Que ela possa reger as duas terras, que ela possa conduzir todo o vivente” – uma análise da teogamia de Hatshepsut como Filha de Amon. Porto Alegre, 2016 DELL, Pamela. Hatshepsut Egypt’s First Female Pharaoh. Londres: Penguin Books, 1998.

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Divindades egípcias – o deus Amon

  Por: Ewerson Thiago da Silva Dubiela Entre as diversas divindades cultuadas no Egito Antigo, concebidas na forma animal ou humana, havia um deus em especial que não tinha a propriedade ou a representação declarada como a de outros deuses, apesar de suas estátuas e baixos-relevos o representarem na forma humana. Este era Amon, deus muito antigo, tão mais quanto Rá, a divindade que havia criado o mundo. Assim, sua existência antecede a criação como foi concebida pelos egípcios. Ele fazia parte da Ogdoada, ou seja, um conjunto de deuses misturados e imersos em um oceano caótico. A Ogdoada era formada pelos seguintes seres divinos: Num e Naunet, Ket e Keket, Amon e Amonet e Hehu e Hehet. Respectivamente, tratam-se das propriedades do Oceano caótico ou líquido inerte, do Escuro, do Invisível ou Oculto e do Espaço Infinito. A Ogdoada pode ser remontada a partir do mito da cidade de Hermópolis e depois, completada, para a nossa compreensão, pelo mito de outra cidade, Heliópolis. O mito da cidade de Heliópolis conta que Atum surgira a partir de um monte criado do Num, o Oceano caótico, e então deu início à criação de outras divindades que hoje conhecemos como Shu e Tefnut, Geb e Nut, Osíris e Isis e, por último, Seth e Néftis. As quatro primeiras figuras são as representações do Ar, da Umidade, da Terra e do Céu. Os últimos são os deuses que davam a legitimidade para a família faraônica conforme nos conta a passagem “As contendas de Hórus e Seth” – Hórus sendo filho de Osíris e Isis, e Seth sendo o deus invejoso.A questão levantada remonta ao episódio anterior à criação, Amon era a propriedade Invisível ou Oculta. Até o final do Primeiro Período Intermediário este deus não era tão conhecido, sendo apenas uma divindade local, de um vilarejo distante da capital Mênfis, quase 650 Km ao sul, em Waset (Tebas), a atual Luxor. Amon tinha vantagens sobre outros deuses, enquanto a maioria poderia apenas ser adorada dentro do próprio Egito, Amon, sendo invisível, podia acompanhar o exército e o faraó para fora do país, era uma divindade imperial. Mas por que o culto cresceu? O motivo pode ter sido político, uma vez que Mênfis já não representava no período a força dos governantes, Tebas tomou a frente da situação para reunificar. Durante o Reino Médio Amon dividia poder, fama e dinheiro com outros dois deuses, Sobek e Montu. Mas, quando veio a invasão de um povo chamado HeqaKhasut, ou os Hicsos, apenas Amon conseguiu manter o culto de forma crescente em detrimento das outras duas divindades. No final do Segundo Período Intermediário, os egípcios, a partir novamente de Tebas e de seu deus patrono, Amon, iniciariam uma política de expansão ou de retomada de territórios, começada ainda na época do faraó Seqenenre Tao II, da XVII Dinastia. Uma batalha que se estenderia pelos reinados de Kamosé e do primeiro rei da XVIII Dinastia, Amósis I. A partir de então, os faraós priorizaram o culto a Amon, mesmo assim, Rá não poderia ser esquecido. Na religiosidade egípcia, Rá era o deus que a tudo criara, ele era o Sol, chamado de Khepri pela manhã, Rá ao meio dia e Atum ao entardecer. A majestade de Rá seria unida com o invisível e imperial de Amon, surgiria uma nova divindade, o rei dos deuses, Amon-Rá. Possuía um clero extremamente forte e rico, inclusive a rainha fazia os cultos à divindade como “Esposa do deus”, deveria acordá-lo todas as manhãs para realizar oferendas e assim, sempre recriar o mundo. Inclusive a rainha Hatshepsut se utilizou de maquinações políticas sobre Amon-Rá para tornar-se faraó, criando uma mitologia na qual dizia que o deus havia se disfarçado como seu pai, o rei Tutmés I, e assim se encontrado com sua mãe, Amósis, em seu leito. Essa história foi colocada nos relevos do templo de Deirel-Bahari, além de outras obras que a legitimavam no poder, chamando o deus de “seu pai”, como nos obeliscos de Karnak. Mais tarde, o faraó Tutmés III, aproveitando-se de um oráculo, dizia que Amon o havia escolhido pessoalmente, colocando sua estátua à sua frente quando era apenas um menino. Este faraó conseguiu conquistar a maior extensão territorial do Egito, da Quinta Catarata do Nilo, na Núbia, até a borda do rio Eufrates, no Iraque. Assim, Amon-Rá era ao mesmo tempo a majestade de Rá atrelado ao poder invisível de Amon o que o tornou uma das divindades egípcias mais conhecidas até os dias de hoje. Amon-Rá – XX Dinastia – MET Museum Amon-Rá com a faraó Hatshepsut – XVIII Dinastia – Templo de Karnak

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