A tumba de Khnumhotep I em Beni Hassan

Khnumhotep I foi um nomarca do nomo de Órix, 16° território do Alto Egito, administrado por um chefe em nome do faraó. A tumba de Khnumhotep I fica localizada em Beni Hassan, uma necrópole com tumbas escavadas na rocha e utilizada principalmente durante o Reino Médio (cerca de 2040 a.C. e 1640 a.C.). Os túmulos do terraço superior foram usados para enterrar pessoas influentes, como os governantes da região e seus familiares. Algumas dessas tumbas preservam pinturas detalhadas sobre atividades sociais, culturais e religiosas da vida desses egípcios.

No século XIX, a tumba do nomarca Khnumhotep I foi categorizada com o número 14, e soube-se que o dono da estrutura funerária serviu especificamente ao faraó Amenemhat I, primeiro rei e fundador da XII dinastia egípcia, conhecida como a fase do apogeu no período. A tumba possui uma grande capela, que originalmente continha pilares, e dois poços funerários talhados em calcário branco. O egiptólogo Percy E. Newberry, que catalogou o complexo funerário, observou que as pinturas nas paredes da tumba estavam muito desbotadas e que na maioria dos casos só podiam ser percebidas com muita dificuldade. Em 2016 e 2017, um grupo da Universidade Macquarie, da Austrália, realizou um trabalho de campo utilizando um software de aprimoramento de imagem. O trabalho foi bem-sucedido ao ponto de serem reveladas cenas de uma procissão funerária e de caça no deserto, até então não identificadas no local.

Voltado para os escritos, na biografia do dono do túmulo, podem ser lidas inscrições como “príncipe hereditário”, “único companheiro” e “grande suserano do nomo de Órix”, o que sugere que Khnumhotep I apoiou o faraó da época e ajudou a manter o controle da região, resolvendo disputas e acabando com rebeliões. Como recompensa, o rei acabou concedendo privilégios para a continuidade dele e de sua família no poder da sua comunidade.  

Um fato interessante sobre as pinturas da tumba, é que elas revelam a interação dos egípcios com outros povos. Na parede leste, voltada para a entrada do local são representadas cenas de lutadores, e entre as pessoas retratadas algumas delas se destacam por portarem armas, roupas, penteados e até cor de pele diferentes dos utilizados nas representações dos egípcios. Estes são os estrangeiros: “núbios”, “asiáticos” e “líbios”.

A identificação do povo núbio se dá, pois, algumas pessoas são retratadas com a pele morena escura e cabelos pretos, curtos e encaracolados. Além disso, eles carregam arcos, flechas e adagas na cintura, o que indica que eles foram incluídos no exército egípcio. Essas representações apontam que os núbios atuavam em ataques de cerco, na guarda pessoal do nomarca, e em atividades de caça, e sugerem que eles podiam desempenhar outras funções na sociedade egípcia, não apenas relacionadas com a guerra.

Existem também cenas de pessoas com a pele amarela pálida, cabelos volumosos avermelhados e barbas espessas, esses indivíduos são identificados como asiáticos. Estes também carregam arcos e espécies de adagas, mas se distinguem em utilizar varas, machados e uma espécie de porrete.

Já em outra parede, sete líbios com a cor de pele rosa amarelado são escoltados por um egípcio e um núbio, as mulheres estrangeiras carregam crianças nas costas e são seguidos por um rebanho de cabras. Esta representação do grupo líbio não está entre as atividades militares de outras paredes, mas entre os registros do proprietário da tumba recebendo produtos de moradores de suas terras, o que pode indicar que Khnumhotep I autorizou a permanência desse grupo no território do seu nomo.  

Apesar da tumba de Khnumhotep I não ser tão grande quanto a outras que existem em Beni Hassan, o estudo sobre ela proporciona um entendimento sobre a dinâmica política e social da então recém começada XII dinastia egípcia. As pinturas das paredes, portanto, são os maiores indícios do dia a dia da população e das interações com estrangeiros que viveram no período de governo do nomarca do nomo de Órix.

 

Texto por  Celi Zinher Tsvetch – monitora do Museu Egípcio e Rosacruz Tutankhamon

 

Referências bibliográficas:

BRANCAGLION, Antônio. Quadro Cronológico -Lista de Reis. Seshat, Laboratório de Egiptologia do Museu Nacional, UFRJ.

COELHO, Liliane. Vida pública e vida privada no Egito do Reino Médio (c. 2040-1640 a.C). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009. Disponível em: <https://app.uff.br/riuff/handle/1/22308> Acesso em: 06 abr. 2023.

DESPLANCQUES, Sophie. Egito Antigo: Uma breve introdução. L&PM Pocket Encyclopaedia, 2009.

MOURAD, Anna-Latifa. Foreigners at Beni Hassan: Evidence from the Tomb of Khnumhotep I (No. 14). American Schools of Oriental Research, 2020. Disponível em:  <https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/710528> Acesso em: 06 abr. 2023.

MOURAD, Anna-Latifa. The Tomb of Khnumhotep I at Beni Hassan. Database of Religious History. The University of British Columbia, 2021.             Disponível em: <https://open.library.ubc.ca/cIRcle/collections/ubccommunityandpartnerspublicati/52387/items/1.0401718> Acesso em: 07 abr. 2023.

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