O Mito Cosmogônico de Heliopólis

Por: Bruno Luiz Deniski – Estagiário no Museu Egípcio e Rosacruz. A religião egípcia é um assunto muito interessante e intrigante. No Egito Antigo a religião estava presente em tudo, desde a organização social até mesmo nas explicações das atividades naturais, como por exemplo o nascer e pôr do sol, que só ocorria porque o deus sol Ra assim queria; da mesma forma o rio Nilo que só fluía porque o deus Hapi assim desejava. Um dos mitos egípcios mais importantes que retratam a criação do mundo é o mito da cidade de Iwnw, conhecida posteriormente como Heliopólis, como foi batizada pelos gregos. Tal mito enfatiza o deus sol Ra como sendo o criador e pai de todos os deuses. E a fonte mais eminente que traz essa mitologia são os chamados Textos das Pirâmides (datado de 2550 a.C.), além de outra muito importante que é o capítulo 17 do livro dos mortos (livro datado de 1580 a.C.), denominado como “Capítulo para sair a luz do dia“, que demonstra a passagem do sol nascente ao poente, onde o sol em si solidificava o pensamento de renovação e o primeiro raio solar caracterizava-se como o ato final da criação divina. E mesmo em datas posteriores pode-se encontrar registros sobre o mito de Heliópolis que se espalharam por várias cidades no decorrer de vários anos. Segundo o mito exposto no Texto das Pirâmides, no início havia o oceano caótico, chamado Nun. Desse oceano, surgiu uma montanha, o primeiro pedaço de terra, chamado Ben Ben. Das sombras apareceu uma garça real, comparável a uma fênix, denominada Bennu. Essa ave pousou sob a montanha e emitiu um forte grito. O silêncio deu lugar ao som. Então, o pássaro voou. De dentro da montanha surgiu Atum, sua luz tomou o lugar da escuridão e da não existência. Ra tomou a forma de Atum, tornando-se “Ra-Atum”. Atum cuspiu seus filhos e vomitou suas filhas, dentre eles o deus Shu, relacionado com o ar atmosférico. Depois surgiu sua irmã Tefnut, associada ao orvalho e a umidade, ambos tiveram uma união estável que originou outras duas divindades, Geb e Nut. A primeira tornou-se a terra e a segunda o céu estrelado. Ra não queria que ocorresse a criação de novos deuses, então ordenou que seu filho separasse os dois netos para evitar que mantivessem qualquer tipo de relação. Shu, em obediência a seu pai, fez a separação de seus filhos, colocando-se entre o céu e a terra. O mito também faz referência ao deus Toth que tentou ajudar os dois irmãos. Para isso, ele jogou e venceu uma partida de Senet com o deus Khonsu (deus da lua), o que originou mais cinco dias no calendário egípcio, permitindo que os dois jovens deuses pudessem se relacionar. Com isso, Geb e Nut deram origem a seus filhos sendo eles Osíris, relacionado com a vegetação e rei dos mortos, Ísis – deusa da magia, Seth – deus do caos, e do deserto e, por último, Néftis – deusa protetora das tumbas. O mito de criação é muito importante para a compreensão da religião egípcia, pois esse mito demonstra as principais características religiosas da sociedade, e o quão devotos eles eram para com os seus deuses. Ele demonstra do mesmo modo as diferenças e as individualidades de cada deidade. O livro dos mortos, um dos principais registros da criação do mundo, demonstra-se mais evoluído do que o Texto das Pirâmides, por exemplo. Essa mudança demonstra a evolução não só do povo egípcio, mas também de suas crenças. Trecho do “Livro dos Mortos” que representa a separação do céu e da terra – deusa Nut (céu) que aparece com o corpo longo e arqueado, deus Shu que a sustenta e deus Geb demonstrado deitado. Imagem em auto relevo do deus sol Ra   Estatua do deus Hórus em sua forma zoomórfica.   Referência Bibliográficas: DESPLANCQUES, Sophie. Egito Antigo. TRAUNECKER, Claude. Os deuses do Egito. DAVID, Rosalie. Religião e Magia no Egito Antigo.

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Hatshepsut – A Rainha-Faraó

Por: Camila Dayane Olexciw do Rosário – Estudante de história e monitora do Museu Egípcio e Rosacruz No Egito Antigo as funções desempenhadas socialmente eram estabelecidas de acordo com as construções sociais, existindo tarefas atribuídas para ambos os sexos. Essas funções poderiam ser alteradas, embora não fosse comum a posição de faraó a uma mulher. Em meados da XVIII Dinastia (1550-1307 a.C.), mediante um momento onde as rainhas haviam conquistado grande espaço dentro do cenário templário e governamental, surgiu Hatshepsut, uma personagem que, durante muito tempo, foi relegada a um posto de usurpadora dentro da Egiptologia. Filha do faraó Tothmés I e da Rainha Ahmés, Hatshepsut perdeu em sua juventude os dois irmãos e uma irmã, tornando-se herdeira legítima do rei. Embora a linhagem real se reservasse a princesa, o faraó possuía um filho com uma esposa secundária, e para que este pudesse ascender ao trono, Hatshepsut o desposou. Ele ficou conhecido como Tothmés II. Com essa união, Tothmés II consagrou-se rei e ambos receberam prerrogativas. Para Hatshepsut foram atribuídas titulações, como por exemplo o de Grande Esposa Real e as honras devidas à “Primeira Dama das Duas Terras”, reconhecido o estado de “Aquela que vê Hórus e Seth”. O casamento rendeu apenas uma filha, a princesa Neferura, também herdeira legítima do trono. Sem mais herdeiros e devido a morte precoce do rei, o trono do Egito ficou à cargo de um filho secundário concebido por uma concubina, a Esposa Real Aset, igualmente chamado Tothmés. Após o falecimento do faraó e pouca idade de Tothmés III, Hatshepsut tornou-se a regente do reino, a fim de administrá-lo até que seu enteado pudesse assumi-lo. O cargo de Regente não existia no Egito, por isso ela manteve-se no poder devido ao título de Grande Esposa Real. A presença da Rainha como regente do Egito é encontrada desde o ano 2 do reinado de Tothmés III e em grande parte das representações, possui ao seu lado a presença do enteado. A partir do quinto ano de Tothmés III as representações da rainha começaram a ser alteradas e no sétimo ano de administração, revelou-se como Rei do Alto e do Baixo Egito. Embora assumiu a representação de Faraó, Tothmés III não deixou de aparecer ao lado de Hatshepsut, eliminando as hipóteses levantadas a respeito da usurpação do trono ao longo dos anos por pesquisadores. As mudanças na maneira como a Rainha-Faraó passou a ser representada se alteraram com o tempo. Essa transformação está relacionada a uma masculinidade que passou a ser assumida por Hatshepsut, utilizada para legitimar seu poder como Faraó, considerando que a mesma possuía o espírito de Hórus, o Deus vivo, em seu corpo e assim poderia governar. Além da representação masculinizada assumida por Hatshepsut, a mesma também utilizou uma mitologia referente ao seu nascimento relacionada ao Deus Amon, a favor de sua aceitação como Faraó. A mitologia está representada no templo de Deir El-Bahari e consagrou Hatshepsut como a filha do Deus Amon, que disfarçado de Tothmés I, relacionou-se com a Rainha Ahmés, que engravidou de Hatshepsut. Como Faraó, manteve um governo próspero e realizou a construção de diversos monumentos. Os primeiros feitos de seu reinado foram os obeliscos no extremo leste do templo de Karnak, que trazem seus títulos como Rei. Apesar da multiplicidade de seus feitos, sua maior construção é o templo de Deir El-Bahari, dedicado a Rainha-Faraó e de beleza arquitetônica imensurável. Seu nome egípcio era Djeser Djeseru que quer dizer, Sublime dos sublimes. Quando suas construções foram descobertas por egiptólogos no século XIX, muitos não consideravam de que aqueles elementos diziam respeito a uma governante mulher, inclusive Champollion, que após a tradução dos hieróglifos visitou o Egito, negou a possibilidade do templo de Deir El-Bahari pertencer a uma Rainha-Faraó. A confirmação veio alguns anos mais tarde, devido a diversos fatores, como, por exemplo, o conhecimento da escrita hieroglífica, onde a letra “t” do nome da rainha é oriundo do símbolo de um pão egípcio, que pode ser interpretado como um determinativo feminino. Hatshepsut governou o Egito por cerca de 20 anos. Não há nenhum registro que indique um mal-estar entre a Rainha e o enteado, possibilidade considerada e já descartada pelos egiptólogos. Deixou inúmeros monumentos e foi muito importante para história egípcia antiga e para a história das mulheres.   Referências: NOBLECOURT, Christiane D. A mulher no tempo dos faraós. Paris: Éditions Stock,1986. SOUSA, Aline F. A mulher-faraó: representações da rainha Hatshepsut como instrumento de legitimação (Egito Antigo – Século XV A.C). Niterói, 2010 LAZZAROTTO, Gabriela – “Que ela possa reger as duas terras, que ela possa conduzir todo o vivente” – uma análise da teogamia de Hatshepsut como Filha de Amon. Porto Alegre, 2016 DELL, Pamela. Hatshepsut Egypt’s First Female Pharaoh. Londres: Penguin Books, 1998.

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