Por Rafaela Gouvea de Souza – Monitora do Museu Egípcio e Rosacruz Tutankhamon
O período ptolomaico teve início em 304 a.C., e perdurou até a conquista Romana em 30 a.C. Foi uma época marcada pelo intenso processo de aculturação, no qual a inserção e assimilação de práticas, expressavam uma forma de legitimação e dominação empregada pelos governantes lágidos sobre os povos egípcios. A dinastia foi fundada por Ptolomeu I Sóter, filho de um nobre macedônio de baixo escalão, que possuiu um papel importante nas campanhas militares lideradas pelo rei macedônico Filipe II, e como general de seu filho, Alexandre Magno.
Pela ativa participação em campanhas militares, Ptolomeu I Sóter pôde se aproximar da família real macedônica e ganhar a confiança de Alexandre Magno, desempenhando papel importante em conquistas do rei. Com a morte do rei Alexandre em 323 a.C., o império macedônico foi dividido entre seus generais, desencadeando diversos conflitos pela sucessão ao trono, estes ficaram conhecidos como a Guerra dos Diádocos. Ao notar a oportunidade de estabelecer seu próprio domínio, Ptolomeu I Sóter assumiu o controle sobre o território egípcio, fazendo o uso de importantes medidas para legitimar seu governo diante da população egípcia, ações que não se restringiram ao seu reinado, pois foram também aplicadas pelos seus sucessores.
A divinização da figura dos soberanos foi uma das práticas adotadas pela dinastia. O culto ao indivíduo, não era uma prática incomum no mundo grego, mas sua adesão pelos governantes ptolomaicos visava a legitimação e consolidação do prestígio da dinastia diante do povo egípcio. Ações estas, que puderam ser observadas de forma mais intensa durante o reinado de Ptolomeu II. O rei foi responsável por estabelecer o culto dinástico, nomeado de Theoi Adelphoi, no qual o casal real passava a receber cultos ainda em vida, e por criar o culto filial e a festa Ptolomaica na cidade de Alexandria, promovida em honra ao seu pai já morto Ptolomeu I Sóter e à sua mãe Berenice I, associada ao culto após seu falecimento; este ritual foi intitulado de Theoi Soteres.
Embora frequentemente o período ptolomaico seja caracterizado pela helenização dos povos egípcios, a interação entre esses grupos foi muito mais profunda do que se pode imaginar. As trocas culturais que ocorreram entre ambas as culturas que coexistiram no mesmo espaço, apontam também uma egipcianização dos gregos. A figura do deus Serápis, criado por Ptolomeu I Sóter como protetor da dinastia lágida e da cidade de Alexandria, demonstrava isso. Congregava em si elementos egípcios e gregos, promovendo por meio de sua representação e culto, a aproximação de ambas as culturas; dialogava tanto com os interesses administrativos do poder ptolomaico, de legitimação e soberania, quanto com a vida cotidiana e espiritual da população egípcia, materializando em si o encontro de diversas deidades, como Osíris, Ápis, Hades, Dionisio, Zeus e Asclépio.
As estratégias empregadas pelos faraós ptolomaicos expressavam a busca pela harmonização entre ambos os grupos e um controle social e político que permitisse agregar, sob a mesma administração, um povo culturalmente híbrido. Mesmo com a sobreposição dos caracteres helenicos em relação aos egípcios, que demonstravam também uma forma de dominação, a assimilação de aspectos egípcios teve papel fundamental na ratificação da dinastia lágida diante do povo dominado, formando no período um mosaico cultural assinalado pela coexistência e influência mútua entre gregos e egípcios.
1. Aplique de Ptolomeu I como Dionísio.
Local de origem: Egito
Proviniência: Coleção Lambros [data e modo de aquisição desconhecidos]; Dikran Kelekian, Nova York e Paris [data e modo de aquisição desconhecidos]; Henry Walters, Baltimore, 1913, por compra; Museu de Arte Walters, 1931, por legado. (https://art.thewalters.org/detail/31459/appliquc-of-ptolemy-i-as-dionysus/) https://art.thewalters.org/detail/31459/appliquc-of-ptolemy-i-as-dionysus/)
2- Pingente com Imagem de Sarapis
Local de origem: Egito
Proveniência:Henry Walters, Baltimore [data e modo de aquisição desconhecidos]; Museu de Arte Walters, 1931, por legado.
(https://art.thewalters.org/detail/25933/pendant-with-image-of-sarapis/)
3 – Fragmento em relevo do templo da oferenda de Ptolomeu II a Osíris e outro deus
Local de origem: Egito, Delta (Behbeit el-Hagar)
Proveniência: Dikran Kelekian, Paris e Nova York, mediante compra; Henry Walters, Baltimore, por compra; Museu de Arte Walters, 1931, por legado.
Referências:
BRANCAGLION, Antônio. Quadro Cronológico – Lista de Reis. Seshat, Laboratório de Egiptologia do Museu Nacional, UFRJ.
GRALHA, J. Poder no Egito ptolomaico: uma abordagem mágico-religiosa da legitimidade Julio Gralha. Guarulhos: Heródoto: Revista do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Antiguidade Clássica e suas Conexões Afro-asiáticas, [S. l.], v. 3, n. 1, p. 79–99, 2018. DOI: 10.31669/herodoto.v3i1.341. Disponível em: https://periodicos.unifesp.br/index.php/herodoto/article/view/1158. Acesso em: 19 dez. 2023.
FREIRE, Fernanda Alvares. Os fundamentos da basileia helenística: Ptolomeu Soter e a criação da dinastia Lágida. 2015. 35 f., il. Monografia (Licenciatura em História) Universidade de Brasília, Brasília, 2015.
Quaranta, Ettore. (2009). A Idealização do Poder Ptolomaico. v. 30. São Paulo: Projeto História : Revista Do Programa De Estudos Pós-Graduados De História, 2009. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/view/2261. Acesso em: 19 dez. 2023.
RUZENE, Felipe Daniel. A Formação do Deus Serápis e o Hibridismo Cultural na Religião do Egito Ptolomaico. v. 7, n. 13, p. 03-17. Cachoeira: Revista Eletrônica Discente História.com, 2020. Disponível em: file:///C:/Users/museu1/Desktop/Estagi%C3%A1rios%20e%20Funcion%C3%A1rios/Celi/econceio1,+1922-Texto+do+artigo-6739-1-4-20210116.pdf. Acesso em: 19 dez. 2023.